Texto Original
Caput II
Qualiter captivatus fuit Perusli, et de duabus visionibus quas habuit volens fieri miles.
4.
1 Quodam tempore, guerra inter Perusium et Assisium existente, captus est Franciscus cum multis suis concivibus et Perusii captivatus, tamen, quia nobilis erat moribus, cum militibus captivus est positus.
2 Cum autem quadam die concaptivi sui tristarentur, ipse, qui naturaliter erat hilaris et iocundus, non videbatur tristari sed quodammodo iocundari.
3 Propter quod unus de sociis reprehendit eum tanquam insanum, quia scilicet laetabatur in carcere constitutus.
4 Ad quod Franciscus viva voce respondit: “Quid putatis de me? Adhuc adorabor per totum mundum”.
5 Cumque unus de nilitibus quibus erat adiunctus uni de concaptivis iniuriam intulisset et ob hoc omnes alii vellent illum deserere, solus Franciscus ei societatem non denegat, sed et alios hortatur ad idem.
6 Expleto autem anno, reformata pace inter civitates praedictas, Franciscus cum suis concaptivis Assisium est reversus.
5.
1 Post paucos vero annos, quidam nobilis de civitate Assisii militaribus armis se praeparat ut ad pecuniae vel honoris lucra augenda in Apuliam vadat.
2 Quo audito, Franciscus ad eundum cum illo aspirat, et ut a quodam comite Gentili nomine miles fiat, pannos pro posse praeparat pretiosos, concive suo pauperior divitiis sed profusior largitate.
3 Nocte igitur quadam, cum ad haec consummanda tota se deliberatione dedisset et ad iter agendum desiderio aestuaret, visitatut a Domino qui eum, tanquam gloriae cupidum, fastigio gloriae per visionem allicit et exaltat.
4 Cum enim illa nocte dormiret, apparuit ei quidam vocans eum ex nomine (cfr. Gen 4,17)ac ducens ipsum in quoddam speciosae sponsae amoenum palatium plenum militaribus armis, scilicet splendentibus clipeis ceterisque apparatibus ad murum pendentibus, ad militiae decorem spectantibus.
5 Qui, cum gaudens plurimum quid hoc esset secum tacitus miraretur, interrogavit cuius essent haec arma tanto splendore fulgentia et palatium sic amoenum.
6 Et responsum est illi haec omnia eum palatio sua esse militumque suorum.
7 Expergefactus itaque gaudenti animo mane surrexit, saeculariter cogitans, tanquam qui nondum spiritum Dei plene gustaverat, se in hoc debere magnifice principari, atque praesagium magnae prosperitatis reputans visionem, iter arripere deliberat in Apuliam ut miles fiat a comite supradicto.
8 Tantum vero laetior solito est effectus ut pluribus admirantibus et quaerentibus unde sibi esset tanta laetitia responderet: “Scio me magnum principem affuturum”.
6.
1 Quoddam tamen magnae curialitatis et nobilitatis indicium in eo praecesserat die immediate praecedenti visionem praedictam quod ipsius visionis non modica occasio creditur exstitisse.
2 Nam omnia indumenta sua quae de novo sibi fecerat curiosa et cara cuidam pauperi militi donaverat illa die.
3 Cum ergo iter arripiens ivisset usque Spoletum ut in Apuliam pergeret coepit aliquantulum aegrotare.
4 Sollicitus autem nihilominus de suo itinere, cum se sopori dedisset, audivit semidormiens quemdam interrogantem ipsum quo tendere cupiebat.
5 Cui Franciscus cum totum suum propositum revelasset, adiecit ille: “Quis potest tibi melius facere? Dominus aut servus?”.
6 Cui cum respondisset: “Dominus”, iterum dixit illi: “Cur ergo relinquis pro servo dominum et principem pro cliente?”.
7 Et Franciscus ait: “Quid me vis facere, Domine (cfr. Act 9,6)?”
8 “Revertere, inquit, in terram tuam (cfr. Gen 32,9) et tibi dicetur quid sisfacturus (cfr. Act 9,7). Nam visionem quam vidisti aliter intelligere te oportet”.
9 Evigilans autem coepit de hac visione diligentissime cogitare,
10 et sicut in prima visione fuerat quasi totus extravagatus prae magna laetitia prosperitatem desiderans temporalem,
11 sic in ista collegit intus se totum, vim eius admirans et considerans adeo diligenter quod illa nocte ultra dormire nequivit.
12 Mane itaque facto, versus Assisium revertitur festinanter, laetus et gaudens quamplurimum, exspectansque voluntatem Domini qui sibi haec ostenderat et de salute sua ab ipso consilium sibi dari.
13 Immutatusque iam mente, in Apuliam ire recusat et se voluntati divinae desiderat conformare.
Texto Traduzido
Caput II
Como foi preso em Perusa e das duas visões que teve quando quis ser cavaleiro.
4.
1 Em certa ocasião, havendo uma guerra entre Perusa e Assis, Francisco com muitos de seus concidadãos foi preso em Perusa; mas como era nobre em costumes, foi colocado como prisioneiro entre os cavaleiros.
2 Certo dia, estando tristes seus companheiros de cativeiro, ele, brincalhão e jovial por natureza, não parecia estar triste mas, de certa forma, alegre.
3 Por isso, um dos companheiros repreendeu-o como louco, porque se alegrava estando na cadeia.
4 Francisco respondeu vivaz: “Que pensas de mim? Ainda serei venerado pelo mundo inteiro”.
5 Como um dos soldados tivesse injuriado a um companheiro e todos queriam isolá-lo por causa disso, só Francisco não lhe negou a amizade mas exortou aos outros a fazerem o mesmo.
6 Passado um ano, restabelecida a paz entre as duas cidades, Francisco voltou com seus companheiros para Assis.
5.
1 Poucos anos depois, certo cidadão nobre da cidade de Assis preparou-se com armas de guerra para ir à Apúlia, para aumentar riquezas ou prestígio.
2 Ouvindo isto, Francisco quis ir com ele e, para ser feito cavaleiro por certo conde de nome Gentil, preparou os melhores tecidos que pode, mais pobre em riquezas que seu concidadão, mas mais generoso na prodigalidade.
3 Certa noite, quando se havia entregado totalmente a preparar tudo isso, e ardia no desejo de viajar, foi visitado pelo Senhor, que o atraiu e exaltou – já cobiçoso de glória – para o fastígio da glória por uma visão.
4 Pois quando estava dormindo nessa noite, apareceu-lhe alguém chamando-o pelo nome e levando-o a um palácio magnífico de uma linda esposa, cheio de armas de guerra, isto é de resplandecentes escudos e outros aparatos pendurados na parede, referentes ao decoro de um exército.
5 Como ele, muito alegre, admirava-se calado sobre o que seria isso, perguntou de quem eram essas armas que fulgiam com tanto fulgor, e o palácio magnífico.
6 Foi-lhe respondido que tudo aquilo, com o palácio, era dele e de seus soldados.
7 Quando acordou, levantou-se de manhã de ânimo alegre, pensando secularmente, como alguém que ainda não tinha saboreado plenamente o espírito de Deus, que por isso deveria tornar-se um magnífico príncipe, e achando que a visão era o presságio de uma grande prosperidade, resolveu iniciar a viagem para a Apúlia para ser feito cavaleiro pelo referido conde.
8 Ficou tão mais alegre que de costume que a muitos que se admiravam e perguntavam de onde vinha tanta alegria respondeu: “Sei que vou ser um grande príncipe”.
6.
1 No dia imediatamente anterior a essa visão acontecera com ele um certo sinal de grande cortesia e nobreza, que parece ter sido uma ocasião não pequena para a própria visão.
2 Pois nesse dia dera a um certo cavaleiro pobre todas as suas roupas pomposas caras, que acabara de fazer.
3 Mas quando começou a viagem até Espoleto para ir à Apúlia, começou a ficar um pouco adoentado.
4 Preocupado com a viagem e já entregue ao sono, ouviu meio adormecido alguém que lhe perguntava para onde ia.
5 Quando Francisco lhe contou todo o seu propósito, ele disse: “Quem pode ser melhor para ti? O Senhor ou o servo?”
6 Como Francisco lhe respondesse: “Ó senhor”, disse-lhe de novo: "Então por que deixas o senhor pelo servo e o príncipe pelo vassalo?”.
7 E Francisco disse: “ Senhor, que queres que eu faça?”.
8 - “Volta para tua terra, disse, e te será dito o que haverás de fazer. Pois deves entender de outro jeito a visão que tiveste”.
9 Ao despertar, começou a pensar seriamente sobre a visão.
10 E como na primeira visão ficara quase todo arrebatado pela enorme alegria, desejando uma prosperidade temporal,
11 nesta recolheu-se todo dentro de si, admirando e considerando sua força tão diligentemente, que naquela noite não mais conseguiu dormir.
12 Quando amanheceu, voltou depressa para Assis, alegre e muito contente, esperando a vontade do Senhor que lhe havia mostrado tais coisas e lhe daria um conselho para sua salvação.
13 Já mudado na mente, recusou ir para a Apúlia e quis conformar-se com a vontade divina.